AS IMPLICAÇÕES DO BREXIT NO SISTEMA REGULATÓRIO INGLÊS

Londres é o maior centro financeiro da União Europeia. A saída do Reino Unido da UE irá ter consequências em todas as vertentes do sistema bancário inglês, podendo causar repercussões nas economias dos Estados Membros. Quer se concorde ou não com o Brexit, cabe aos lideres europeus criar as condições necessárias para que o processo seja o mais rápido e flexível possível, permitindo que os mercados financeiros dos Estados Membros mantenham o seu funcionamento o mais regular possível.

O bom funcionamento dos mercados tem vindo a ser impulsionado desde o final da década de 90 por um conjunto de medidas regulatórias que visam criar um mercado mais estável e confiante tanto para as instituições financeiras como para os seus clientes. Uma das principais medidas foi a criação do mercado único europeu que facilita a expansão das atividades das instituições financeiras para outros Estados Membros através de um sistema de passaporte. Por outro lado, as novas medidas regulatórias também prossupõem a necessidade de cooperação entre os diferentes reguladores de modo a que haja uma espécie de mecanismo único de supervisão capaz de controlar todas as atividades das instituições financeiras.

Essa supervisão foi reforçada após as consequências da crise financeira mundial, com medidas regulatórias mais fortes e adoção dos pareceres de instituições como o Conselho de Estabilidade Financeira (Financial Stability Board) ou o Banco de Compensações Internacionais (Bank for International Settlements).

Entre as medidas regulatórias mais importantes estabelecidas pela UE, e na qual assenta a regulamentação dos bancos no Reino Unido, estão a Diretiva relativa à supervisão prudencial das instituições de crédito e empresas de investimento, mais conhecida por CRD IV (Capital Requirements Directive) e a Diretiva que fornece aos reguladores e supervisores medidas para lidar com os bancos que declaram falência, mais conhecida por BRRD (Bank Recovery and Resolution Directive).  Com o Brexit, os legisladores ingleses vêm-se, assim, obrigados a rescrever uma nova legislação para a regulamentação bancária, pois todas as legislações adotadas pelas Diretivas da EU ficaram sem efeito.

Como (ainda) membro da UE, o Reino Unido usufrui da livre circulação de serviços financeiros e o regime de passaporte permite que as instituições financeiras inglesas forneçam os seus serviços a clientes dentro do Espaço Económico Europeu (EEE). A saída do Reino Unido da UE põe em causa as vantagens de acesso ao EEE pelo que existe a possibilidade de ser acordado o chamado Soft Brexit. Esto acordo implica que o Reino Unido fique com um estatuto equiparado à Noruega, Islândia e Liechtenstein, conservando o acesso ao Mercado Único e as relações comerciais e económicas com os Estados Membros através do regime de passaporte. Por outro lado, este acordo implica que os bancos ingleses estejam em conformidade com a regulamentação da UE.

Outro processo de Brexit igualmente vantajoso, sem grandes consequências para o sistema financeiro europeu, consiste na criação de um acordo de comércio livre (Free Trade Agreement) entre o Reino Unido e a UE. Este acordo permite também a livre circulação de pessoas, mantendo os mesmos princípios da regulamentação em vigor atualmente.

Caso o Reino Unido e a UE não cheguem a nenhum destes dois acordos mais vantajosos, uma terceira opção pode ser o acesso ao passaporte dos chamados “países terceiros”, ou seja, países não-UE para certos serviços. Este regime implica que as instituições financeiras inglesas estejam registadas num organismo equivalente à ESMA (European Securities and Markets Authority), implicando um regime regulatório semelhante. Por outro lado, as Contrapartes Centrais (CCPs) inglesas teriam de funcionar de um modo semelhante às CCPs da UE, estando em conformidade com o EMIR (European Market Infrastructure Regulation). Embora o sistema de passaporte tenha ainda alguns pontos fortes, este regime impõem a impossibilidade das instituições financeiras inglesas poderem prestar serviços bancários fundamentais aos países dos Estados Membros como, por exemplo, depósitos, empréstimos ou pagamentos.

Por fim, o pior cenário, o chamado Hard Brexit, implica um acesso muito limitado à UE com a perda do sistema de passaporte. Neste cenário, as instituições financeiras inglesas teriam de estabelecer presença num Estado Membro através, por exemplo, de uma sucursal e ficar sujeito à regulamentação desse país. Outra alternativa será as instituições alterarem a sua sede para um Estado Membro, mantendo uma sucursal ou representação no Reino Unido, o que lhes dá acesso ao regime de passaporte.

Desde Junho de 2016 que as instituições financeiras inglesas tiveram de ponderar o impacto que esta nova realidade terá no seu negócio. Sem certezas sobre qual dos cenários referidos anteriormente irá vigorar, uma coisa é certa: o processo de negociação acaba a 29 de Março de 2019 com o Reino Unido a sair da União Europeia com ou sem acordo.